Intervenção da Secretária-geral da CGTP-IN

camarinha isabelIntervenção de Isabel Camarinha, Secretária-geral da CGTP-IN.
Semana Nacional de Luta. 25 de Junho, Praça do Município, em Lisboa.

Camaradas,

Saudamos os trabalhadores que de norte a sul, nos Açores e na Madeira, nos sectores público e privado, estão em luta, fazendo desta Semana um momento alto da reivindicação e exigência de direitos.

Saudamos os que asseguram bens e serviços essenciais à nossa vida, seja no SNS, na educação, na cultura, no poder local e na justiça, mas também na agricultura, pescas, indústria e serviços. O trabalho é o motor do desenvolvimento e os trabalhadores os seus obreiros. É o trabalho que cria a riqueza e por isso exigimos que para o trabalho reverta uma parte maior daquilo que produzimos!

Saudamos os que hoje, aqui em Lisboa, enchem a Praça do Município, respeitando as normas de segurança e demonstrando, tal como fizemos no 1º de Maio, que a luta pelos direitos não pára e a nossa voz não se cala, que a liberdade sindical não está confinada, que o surto epidemiológico não pode servir para acentuar a exploração, atropelar direitos e impor a lei da selva.

Três meses e meio depois da irrupção do novo corona vírus no nosso país e é cada vez mais clara a necessidade de alterações profundas, desde logo nas normas que regem as relações laborais, mas também ao nível da valorização dos salários, no reforço da intervenção do Estado, na aposta na produção nacional e na protecção dos trabalhadores nos locais de trabalho e nas deslocações, mas também.

Precisamos que sejam revogadas as normas gravosas da legislação laboral e resposto o direito de contratação colectiva com a revogação da caducidade e a reintrodução do princípio do tratamento mais favorável.

A precariedade dos vínculos laborais confirma-se como instrumento usado pelos patrões para despedir, está na base do aumento em mais de 100 mil dos desempregados. Não foi o surto que trouxe a precariedade, este é um vírus que há muito instabiliza a vida de milhares de trabalhadores no nosso país, adia projectos e nega o direito a uma vida melhor.

São os baixos salários que, cortados em um terço, ou por inteiro, a mais de 1 milhão de assalariados, atira para a privação e a pobreza um número crescente de trabalhadores. E os baixos salários não são um produto da Covid-19, mas sim de opções de sucessivos governos que privilegiam os lucros do capital em detrimento das retribuições, optam por garantir as rendas dos especuladores em prejuízo do desenvolvimento do país.

São três meses e meio em que se demonstrou a importância e o papel insubstituível do Estado, desde logo na saúde. Enquanto o SNS – apesar de décadas de desinvestimento - respondia, os privados do sector dedicavam-se a procurar formas de lucrar, de extorquir o máximo possível, em “fazer da crise uma choruda oportunidade de negócio”. Foi a Segurança Social, os serviços de limpeza urbana, o poder local democrático e a Escola Pública, com todas as limitações que são conhecidas e que são resultado das políticas desenvolvidas, a estar na linha da frente.

Ao contrário do que todos os dias nos dizem, não é de menos Estado que precisamos, mas de mais e melhor intervenção, de mais investimento, de mais e melhores serviços públicos e de mais trabalhadores com salários e carreiras dignas. Precisamos de um Estado que agarre o desenvolvimento do país como uma prioridade, a soberania como uma condição fundamental e se liberte das amarras impostas pelo capital.

Como desde o início afirmamos, o desemprego e a perda de rendimentos do trabalho, não são inevitáveis. A recusa em introduzir regras que respondam a estes problemas resulta de uma opção do Governo e contrasta com as medidas dirigidas às grandes empresas, as mesmas que ano após ano acumulam milhares de milhões de euros de lucros, e agora encontraram refúgio nos apoios concedidos pelo Governo.

O Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) e o Orçamento do Estado Suplementar (OES) na forma como foi apresentado, não só não inverte a situação, como em alguns casos a agrava.

Sem prejuízo da mitigação de algumas das mais gritantes injustiças, fruto da pressão e insistência da CGTP-IN, do reforço ainda que para já nos pareça insuficiente dos serviços públicos e, em especial do SNS, continua a não estar prevista a proibição dos despedimentos nem a reintegração dos trabalhadores que perderam o emprego durante o surto epidémico, continua a não estar previsto o pagamento das retribuições a 100% aos trabalhadores abrangidos pelo layoff e o seu sucedâneo, permanece a possibilidade de grandes empresas, com lucros acumulados fabulosos, poderem recorrer às ajudas do Estado.

Ainda há tempo para corrigir esta situação e garantir direitos a quem trabalha.

Camaradas, os direitos dos trabalhadores não só não são inimigos do desenvolvimento, como são uma condição para uma mais rápida, robusta e justa recuperação económica.

Ao contrário do que nos querem fazer crer, o aumento geral dos salários assume nesta fase uma importância acrescida. O aumento de 90€ como exigimos, garante a satisfação de necessidades, em alguns casos, básicas, dos trabalhadores e das suas famílias, e é um elemento fundamental da dinamização da economia. Aos que oferecem resistências a esta proposta e afirmam que não podem aguentar o aumento em 3 euros por dia dos seus assalariados, lembramos que a proposta da CGTP-IN significa uma injecção na economia de mais de 8 milhões de euros ao dia que vão para consumo e assim mais do que compensam o impacto da subida do salário. Os últimos quatro anos demonstraram isto mesmo, que uma maior massa salarial teve efeitos positivos na economia e não o inverso. O momento actual exige este choque na procura que o aumento dos salários vai provocar.

A defesa do emprego, com a proibição dos despedimentos e a alteração das leis que fomentam a precariedade é outra condição essencial. Não é com vínculos precários, com a elevada rotação entre empregos, que se promove um novo modelo de desenvolvimento assente numa produção de maior valor acrescentado. Só com trabalho com direitos conseguimos dar resposta às necessidades de desenvolvimento do país.

Com mais salários, melhor emprego, criamos as condições para um impulso na dinamização da produção nacional, não só porque garantimos estabilidade na e à força de trabalho, como asseguramos o escoamento produção.

Na nossa opinião é isto que falta ao PEES e ao OES, é esta centralidade do trabalho e a respectiva valorização dos trabalhadores que continua a faltar.

É significativo que parte daquilo que o Governo prevê no PEES, não tenha cobertura financeira integral no OES e o Governo esteja à espera da União Europeia, para a qual transferimos com custos pesadíssimos a nossa soberania monetária e da qual estamos reféns, à mercê das imposições a favor do capital, apelidadas pomposamente de “condicionalismos”, que sempre acompanham as suas medidas.

Daqui afirmamos que não é necessário esperar, que os colossais níveis de concentração da riqueza nas mãos de um reduzido número de grandes capitalistas, possibilita ao Governo ir buscar já dinheiro onde ele está.

Não há dinheiro? Taxem-se as fortunas que a partir do nosso país são transferidas para os paraísos fiscais que – e é a própria Comissão Europeia que o confirma – tem em Portugal um país no pelotão da frente desta prática, com um montante equivalente a 25% do PIB isento de impostos estacionado bem longe. Aproveitem o OES para obrigar os poucos que tanto lá têm a pagar impostos, e a receita fiscal pode aumentar em 18 mil milhões de euros, valor bem acima das melhores perspectivas de apoios a receber da UE.

Não há dinheiro? Taxem-se os dividendos que todos os anos ultrapassam os 20 mil milhões de euros e são apropriados no nosso país pelo capital nacional e estrangeiro, que ao abrigo de regras para evitar a dupla tributação, acabam por não pagar nada, nem aqui nem em lado nenhum, e metem esta verba limpa e isenta de impostos ao bolso. Uma taxa de 35%, só aplicada aos dividendos distribuídos pelas grandes empresas e teríamos uma receita adicional de 3 mil e 700 milhões de euros para investir na saúde, na educação, na justiça e na cultura, no reforço da protecção social e do poder local democrático ou no investimento público que modernize o país e construa os alicerces de um desenvolvimento social, territorial e ambientalmente sustentável.

Não há dinheiro? Só no jogo especulativo dos mercados de capitais, no nosso país e apenas nos primeiros nove meses do ano passado, passaram mais 447 mil milhões de euros que, caso tivessem pago uma taxa como a CGTP-IN há muito exige de 0,25%, teriam contribuído com mais de mil e cem milhões de euros de receita fiscal.

São três medidas, que incidem sobre um muito reduzido número de contribuintes e que dotam o Estado dos recursos financeiros que precisa, sem ter de estar dependente do que lá de fora for decidido.

São três medidas que afrontam o grande capital, e que quem defende os seus interesses se apressará em classificar como impossíveis, porque haveria fugas, porque só têm efeito se forem aplicadas em grande escala, por muitos países, porque os custos seriam pesadíssimos e mais umas tantas e estafadas justificações, para que no fundo continue tudo na mesma, com os trabalhadores e o povo a pagar e os privilegiados do costume a arrecadar.

Estas medidas que apresentamos garantem receita já neste OES, mas o Governo também pode cortar na despesa.

Pode cortar nas rendas das PPP e desde logo nas rodoviárias. Os privados ganham sempre: quando há tráfego, recebem directamente por quem lá circula e pelas ajudas do Estado; quando não há trafego, recebem o que não ganham em portagens por via dos impostos, porque o Estado garante sempre a rentabilidade. Os privados que ganham sempre, e nós, por via directa e indirecta, perdemos quaisquer que sejam as circunstâncias. O Governo que corte aqui, e tem uma poupança superior a mil milhões de euros.

Pode cortar, também, nas transferências para o NOVO BANCO, um banco que por opção política de PS, PSD e CDS continua a ser privado, mas que já sugou milhares de milhões de euros de dinheiro público, que este ano, de forma leviana, já foi buscar 850 milhões de euros e o gestor de serviço já veio dizer que é preciso mais... tanta facilidade, tanto descaramento quando se trata de desviar dinheiro público para o bolso dos accionistas das lones star e tanta resistência, tanta impossibilidade, quando se trata de aumentos salarias aos trabalhadores da administração pública que há dez anos, na generalidade, não têm quaisquer actualizações e ainda tiveram vários cortes nos vencimentos.

Sim camaradas, o Governo pode cortar na despesa, pode cortar nos juros que paga à UE e que resultam do programa de exploração e agressão imposto por Bruxelas, acordado com o PS e executado exemplarmente pelo Governo PSD/CDS. Anualmente são mais de mil milhões de euros, só em juros e encargos, que o Estado paga à UE, quando as mesmas instituições da UE cobram juros zero aos bancos que a ela recorrem... Deixaram cá as alterações à legislação laboral, um parelho produtivo mais enfraquecido, um povo mais empobrecido, um país mais dependente e ainda lhes pagamos juros e comissões.

É hora de romper com estas imposições, com esta legislação laboral, com as regras que subjugam o desenvolvimento nacional ao que lá fora decide o grande capital.

Os tempos que se avizinham serão decisivos. A ofensiva aos direitos está em marcha, com o recurso a uma poderosa campanha ideológica, com a introdução de alterações na relação laboral que tiveram como justificação o surto epidemiológico, mas que o grande patronato quer generalizar e eternizar, porque são fundamentais para o aumento da exploração.

Cabe ao Movimento Sindical esclarecer os trabalhadores, ouvir e interiorizar os seus problemas, anseios e aspirações.

Cabe ao Movimento Sindical mobilizar e organizar a luta, porque é na acção e na força dos trabalhadores que assenta a capacidade de resposta, a derrota da ofensiva e a conquista de direitos.

A Semana de Luta que estamos a desenvolver demonstra isto mesmo - a disponibilidade dos trabalhadores para agarrarem nas suas mãos os direitos, para defenderem os salários, para exigirem melhores retribuições. E já trouxe resultados em muitas empresas desde o início da semana.

São centenas de acções, em todos os sectores e regiões, com trabalhadores do público e do privado a reivindicarem o que nos pertence, com greves, plenários, acções à porta de empresas e associações patronais, tribunas públicas, concentrações, marchas e desfiles...

Centenas de acções daqueles que não desistem da elevação das suas condições de trabalho e de vida, unidos nos sindicatos de classe da CGTP-IN, em convergência ao longo de toda a semana, que amanhã ainda continuarão.

Este movimento sindical, que comemora em 2020 cinquenta anos de existência, cá está, não viramos a cara à luta, não nos resignamos às falsas inevitabilidades, não desistimos de lutar por melhores condições de trabalho e de vida, pelo desenvolvimento soberano do país, pelo futuro de Portugal e dos que cá querem viver e trabalhar.

O reforço dos sindicatos da CGTP-IN, a responsabilização de quadros e o envolvimento de todos está na nossa matriz, faz parte desde sempre desta que é a maior organização social nacional, porque é constituída por trabalhadores, dos trabalhadores e para os trabalhadores. Neste sentido, estamos a desenvolver uma campanha de sindicalização, para trazer mais trabalhadores aos nossos sindicatos, para assim melhor defendermos os direitos, alargarmos a nossa acção e intensificarmos a luta!

Uma luta que vai continuar, porque assim o exige a defesa e conquista de direitos!

VIVA A SEMANA DE LUTA EM DEFESA DA SAÚDE E DOS DIREITOS DOS TRABALHADORES!

VIVA A CGTP-IN!

VIVA A LUTA DOS TRABALHADORES!

A LUTA CONTINUA!